terça-feira, 5 de abril de 2011

ELINO JULIÃO


ELINO JULIÃO, UMA LENDA VIVA DO FORRÓ POTIGUAR


"Elino é compositor

De marchinhas e forró

Xote, merengue, bolero

De brega e carimbó

E é o filho mais querido

Das terras do Seridó.

(versos de cordel de Chico Gomes em homenagem a Elino Julião)


Assim como Dona Militana está para o Romanceio Popular, Chico Daniel para o Mamulengo, Manoel Marinheiro para o Boi-de-Reis, Mestre Cornélio para o Araruna e Câmara Cascudo para as letras potiguares, Elino Julião é uma lenda viva do legítimo forró pé-de-serra, representante autêntico da música norte-rio-grandense.

Elino Julião sempre foi um menino danado. Logo cedo, se destacou entre os treze irmãos pela sua esperteza, fazendo versos e batendo em latas, enquanto carregava os galões d’água do açude para casa. Filho de tocador de cavaquinho, Elino tinha o dom musical, apresentando seu talento nos bailes da Festa de Sant’Ana, em Caicó, onde fazia muito sucesso entre a juventude dourada daquela época.

Nasceu no ano da graça de 1936, aprendendo as primeiras letras com a senhora Lutgard Guerra (irmã do escritor Otto de Brito Guerra), proprietária da fazenda Tôco, município de Timbaúba dos Batistas, sertão do Seridó, de onde saiu na boleia do caminhão de seu Artur Dias, ainda adolescente, para tentar melhorar de vida em Natal.

Já rapazote, pelos idos dos anos 50, morando no bairro das Quintas, na casa de uma tia, Elino começou a participar de programas de auditórios, fazendo shows ao vivo, sendo transmitido pela Rádio Poti para todo o Rio Grande do Norte, sob o comando do radialista e animador Genar Wanderlei. “Jackson do Pandeiro me viu cantar para o pessoal do auditório e me convidou para eu ir ao Rio de Janeiro cantar com ele. Depois que servi o Exército, fui morar com ele na Glória, na Rua Cândido Mendes e fazer parte do conjunto dele”, disse Elino Julião.

No início da década de setenta, Luiz Gonzaga estreou um programa na TV Cultura chamado “Chapéu de Couro” e convidou Elino para trabalhar como ritmista, permanecendo ao lado do Rei do Baião por mais de três anos. Durante esse período, Elino morou na casa de Luiz Gonzaga e de seu irmão, Zé Gonzaga, conhecidos como os “Príncipes do Forró”. Essa turma formava o Trio Nordestino e foi na Polygram que Elino gravou suas primeiras canções, “Rela Bucho”, “Puxando Fogo” e “Xodó do Motorista”, que logo se transformaram em verdadeiros sucessos.

Em reconhecimento ao seu talento, durante a comemoração dos 250 anos da Festa de Santana, em Caicó, alguns fãs de Elino fizeram uma homenagem inusitada. Um grupo lançou o fã-clube "Rabo do Jumento", numa alusão ao grande sucesso que sempre embalou as farras no mercado, alegrando os bares e também fazendo parte da programação de rádio da cidade. “O rabo do Jumento” foi lançado no meio da “Feirinha de Caicó” com grande repercussão na cidade, dando direito à carteirinha para sócio.

Atualmente, Elino Julião é um cantor e compositor famoso, reconhecido no Brasil inteiro, principalmente no Nordeste. Sua música também ecoa nas rádios internacionais em países como Portugal, Itália, Bélgica, Uruguai, Argentina e outros tantos. No seu vasto repertório, Elino compõe com maestria xotes, marchinhas juninas, boleros, cocos, baião, forró, carimbó, merengue e outros ritmos.

Em reconhecimento ao seu grande talento e importância para nossa cultura, em 2004, o povo de Natal concedeu ao forrozeiro o título de “Cidadão Natalense”, num grande evento na Câmara Municipal. Outra homenagem justa é a gravação do CD “O Canto do Seridó”, dentro do projeto Nação Potiguar, com o patrocínio da Fiern/Sesi e realizado pela Fundação Hélio Galvão.

O CD ‘O Canto do Seridó’ chega a ser um disco didático para quem acha que forró é uma coisa só. Aqui tem xote, baião, galope, rojão, e algo fundamental que os atuais compositores do gênero vêm perdendo: a capacidade de abordar temas simples, dentro do formato que foi sucesso popular tanto de Elino Julião, quanto de Jackson do Pandeiro ou Genival Lacerda”, escreveu o jornalista José Teles para o Jornal do Comércio, de Recife.

Nesse CD, Elino Julião consegue reunir importantes artistas brasileiros como Dominguinhos, Fagner, Elba Ramalho, Lenine, Xangai, Marines e Tetê Espíndola, além da participação dos músicos potiguares Galvão Filho e Isaque Galvão. Ultimamente, sua musicalidade tem sido revisada e gravada por baluartes da música nordestina como Fagner, Zeca Baleiro, Antônio Nóbrega e Mestre Ambrósio, só para citar alguns.

Elino já produziu mais de 700 músicas em 40 discos de vinil e seis CD’s. Depois que veio morar na Cidade Satélite, em Natal, Elino Julião gravou três CD’s, “O Canto do Seridó 1 e 2” e outro chamado “A Mulher é quem Manda”, em parceria com a compositora Veneranda Araújo, sua companheira há 30 anos e fã declarada.

Compositor de forró afinado, cantador competente, Elino Julião carrega nas entranhas d’alma um grande apego a sua terra e as tradições do seu povo. Sua poesia expressa todos os aspectos da vida sofrida do sertanejo, seus costumes simples e suas festas populares. Sua música conta histórias de um Seridó encantado, das lembranças encravas no peito, onde a sua vivência de menino traquino é relatada com irreverência, usando o palavreio do mais puro e sutil humor nordestino.

Duas palavrinhas com Elino Julião:

Quais as lembranças do seu tempo de menino no sertão do Seridó?

Lembro de Timbaúba dos Batistas, onde vivi minha infância, foi onde eu nasci. Minha vida de menino, botando água em jumento lá no Açude Velho, correndo atrás de gado... Aquilo nunca saiu da minha lembrança e do meu coração. Eu vou sempre a Timbaúba e quando chego, a gente faz festa, reúne o pessoal pra fazer cantoria e relembrar os velhos tempos.

Você ficou nacionalmente conhecido com a música “Rabo do Jumento”, qual foi a fórmula do sucesso? Como nasceu a música?

Eu trabalhava com Jackson do Pandeiro quando gravei o forró “Rela Bucho” que repercutiu bastante no Brasil inteiro e as portas começaram a se abrir. Pra fazer esse forró, eu me lembrei de um fato ocorrido quando eu era garoto no sítio onde nasci, chamado Tôco, em Timbaúba dos Batistas. E me lembrei que por lá, apareceu um cabra bem alto, vindo do Piauí, dos olhos azuis, com uma peixeira de um lado e uma foice nas costas, chapéu de couro e sem camisa. Chegou montado num jumento, disse: “Quem é o dono daqui?” e eu respondi: “É seu Ermogênes”. Era um tal de Nascimento que vivia pelo mundo e pediu morada para seu Ermogênes. E Nascimento ficou, ficou e foi ficando... E um dia, eu estou botando água no meu jumentinho – era tempo de inverno, todo muito contente e muito alegre – e eu botei o jumento na manga do açude e fui tomar banho, deixando o bicho por lá. Nascimento tinha plantado uma rocinha na vazante do açude e já estava tudo bonito. Muito jerimum, muita batata, muito milho, feijão ramando... Aquela coisa linda. Eu descuidei e o jumento pulou a cerca e foi comer a lavoura de Nascimento (risos)... Rapaz, Nascimento virou uma fera. “Como é que se faz uma coisa dessas? Vou fazer a mesma coisa com você”, disse Nascimento. Ele deu uma peixeirada e cortou o rabo do jumento. Eu fiquei só espiando pra ele calado, com um medo danado. Foi nesse momento que ele disse: “Olhe, se você falar pra alguém que fui eu que cortei o rabo do jumento, eu faço a mesma coisa com você”. Então, eu fiquei pensando: “Eu não tenho rabo para Nascimento cortar”. Quando eu me lembro disso me dá um dó danado do jumento. Depois, ficou o burburinho na fazenda... Uns diziam: “Ah, se eu pego esse cabra que fez isso com o coitado do jumento eu degolo”, outros diziam: “Eu enfio a faca todinha no bucho dele”. E ele ficava escutando aquilo tudo bem quetinho, já cismado. Eu ficava bem caladinho e os cabras vinham me perguntar: “Você não viu nada?” e eu dizia: “Não vi nada não senhor”. E nada de dizer que tinha sido Nascimento. Eu ia dizer? Nascimento tinha jurado cortar o meu rabo também... (risos). Depois, Nascimento se arrependeu e quis pagar o rabo do jumento. Então eu fiz os versos: “Eu não quero pagamento Nascimento, eu só quero é outro rabo no jumento”.

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